From: déia
Sent: Wednesday, April 20, 2011 6:24 AM
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Subject: <> Digital Drops <> música - 6 LPs - Toni Tornado - ANTÔNIO ADOLFO & A BRAZUCA - Rita Lee
repassando 1- TONY TORNADO - 1972 Faixas: 01.Mané beleza 02. Não grile a minha cuca 03. Torniente 04. Eu duvido muito 05. Sinceridade 06. Podes crer, amizade 07. Aposta 08. Bochechuda 09. Uma idéia 10. Eu tenho um som novo 11. Tornado Ele já está com 80 anos de idade, mas semelhante a outros membros de nossa etnia, isso não é percebido visualmente – ainda é aquele jovem, que no V Festival da Canção, cantava BR-3, com o punho levantado, imitando a atitude dos integrantes dos Panteras Negras. Antonio Viana Gomes, ou, Toni Tornado. O ator e cantor nasceu no dia 26 de maio de 1930, em Mirante de Paranapanema, estado de São Paulo, região hoje muito mais conhecida pela concentração de assentamentos do Movimento Sem Terra, liderados por José Rainha. Sua vida mudou quando aos 11 anos, em 1941, resolveu sozinho, ir para o Rio de Janeiro, onde foi morar na rua como menino de rua. Para sobreviver, ganhava alguns trocados como engraxate e vendedor de amendoim, na praia e nos sinais de transito. Após uma breve passagem por uma instituição de acolhimento a adolescentes carentes, acaba se alistando no Exercito do Brasil, chegando a servir na expedição ao Oriente Médio. A rápida convivência com soldados norte-americanos, Toni passa a cantar rock, e logo é revelado na Radio Mayrink Veiga, no programa Hoje é dia de rock. Seu talento, logo lhe gerou a oportunidade de integrar o elenco da peça Brasiliana. Foram anos de excursões internacionais, e na passagem pelos Estados Unidos, acabou separando-se do grupo. Toni Tornado viveu clandestinamente nos Estados Unidos por três anos, sendo fortemente influenciado pelo Movimento Black Power e por James Brown. Em Nova Iorque, no bairro harlem, de predominância negra, por falta de oportunidade acaba trabalhando para traficantes. Neste período também conhece um brasileiro, que viria se tornar famoso no país: o Tião Maconheiro, hoje conhecido como Tim Maia. Mas quando compra um Cadillac chama atenção da policial, e acaba preso e deportado para o Brasil. Em solo nacional Toni Tornado tem o primeiro choque com o Governo Militar – agentes do DOPS, assustam-se com as cores berrantes e sua roupa, e sua postura altiva, incomum no afro-brasileiro do período e prendem o artista. Mas sua sabedoria negra, o estimula a dar declarações desconexas, deixando nos agentes a imagem de um negro doido. O libertam, mas antes o humilham. Mas não seria seu primeiro problema com a Ditadura Militar. Em um show da Elis Regina, quando ela canta a musica Black is Beautiful, sobe no palco, dança com o punho levantando, novamente lembrando uma atitude Black Power. Policiais o prendem novamente e eles tentam de novo o humilhar, sem conseguir sucesso. O negrão tinha uma grande força de vontade e resistência. Em 1972, a fama teatral o leva para a TV Tupi onde interpreta em novelas. Tornado fez inúmeros filmes, com destaque para o papel de Ganga Zumba em Quilombo, dirigido pro Caca Diegues. Nesta fase televisiva, dois fatos o marcaram: os seis anos de namoro com a atriz Arlete Salles, que foi inclusive perseguida por namorador um negro. E o papel como Rodesio, capanga da viúva Porcina e Roque Santeiro, onde Dias Gomes, o novelista, queria mostrar um final, onde os dois ficassem juntos, mas que o medo do preconceito racial, fez que a idéia fosse abandonada. Recentemente em entrevista a Revista Carta Capital, o velho Toni Tornado renasceu ao criticar inclusive as novelas da Rede Globo, onde ele e outros atores negros são relegados a pequenos papeis, e as histórias não ajudam na auto-estima da comunidade negra. O que vai marcá-lo é sua interpretação de Br-3, com o Trio Ternura. Uma atitude no palco que faz falta em muitos cantores negros, excetos nos rappers – alguém que assuma a própria cor. Texto de Marco Antonio dos Santos, publicado originalmente no blog Marco Negro 2- Faixas: 01. Juliana 02. Futilirama 03. Moça 04. Dois tempos 05. Vôo da Apolo 06. Porque hoje é domingo 07. Maria Aparecida 08. Psiu 09. A cidade e eu 10. Pelas ruas do meu bairro 11. Teletema O TÍTULO de uma música de grupo em questão já diz tudo: "Que se dane". Se algum dia a música brasileira teve uma atitude dessas, com certeza foi numa das sessões de gravação de um dos antigos LPs de Antonio Adolfo & A Brazuca. Foi uma das fases mais criativas da nossa música, um daqueles raros momentos em que se percebe que tudo é possível. Até mesmo misturar toada, soul, samba, rock e psicodelia. A receita acima aparece no dois discos que o tecladista e compositor Antonio Adolfo gravou ao lado da Brazuca, pela antiga Odeon. Para quem quiser conferir, ambos os discos estão em catálogo em CD - o primeiro, que contém o sucesso "Juliana", saiu já há algum tempo, na série Odeon 100 anos, e o segundo, fora de qualquer série, já pode ser encontrado em algumas lojas. Um pouco de história, para quem não conhece: Antonio, nascido Antonio Adolfo Maurity Sabóia (sim, ele é irmão do sumido Ruy Maurity) vinha da mistura de jazz e bossa nova em grupos como Samba 5 e Conjunto 3D - o apreço pela mistura de brasilidade e tecnologia, que dá as caras nas letras e melodias da Brazuca, já aparece aí. Antonio trabalhou com muita gente, mas é mais conhecido pela parceria com o letrista Tibério Gaspar, que deu em um rico leque de canções gravadas por Wilson Simonal ("Sá Marina"), Toni Tornado ("BR-3"), Trio Ternura ("Manequim"), Evinha ("Teletema"), etc. Sucesso não faltou: "Teletema" teve a glória de ser uma das primeiras músicas do país veiculadas em trilhas de novelas (Véu de noiva, 1970, lançada pela Philips). E "BR-3", soul lisérgico de primeira linha, foi classificada num Festival Internacional da Canção. Pouco antes dessa época, Antonio & Tibério já haviam se juntado a um time daqueles: as vocalistas Bimba e Julie, o baixista Luizão Maia (acompanhante de artistas como Elis Regina e Erasmo Carlos e tio do também baixista Arthur Maia), o guitarrista Luiz Cláudio Ramos e o baterista Vitor Manga. O primeiro disco do novo grupo, Antonio Adolfo & A Brazuca, saiu em 1969 saudado por Carlos Imperial, Roberto Carlos, Chico Anísio, Augusto Marzagão e Luizinho Eça (que escreveram os textos da contra-capa) e puxado por "Juliana", outro hit turbinado por festivais (2º lugar no IV FIC). No recheio, toada-soul (a própria "Juliana"), sons influenciados por Beatles ("Futilirama", "Dois tempos"), uma espécie de ciranda moderna ("Moça"), soul brasileiro psicodélico ("Vôo da Apolo", com pioneiros efeitos de teclados) e outras melodias de emocionar, como "A cidade e eu", "Pelas ruas do meu bairro" e a animadinha bossa-soul "Maria Aparecida", além da versão original de "Teletema", fechada por conversas de estúdio e pelo bater de uma porta. Um trabalho maravilhoso que, sabe-se lá porquê, nunca havia sido relançado. E como já saiu há algum tempo, reze para encontrar algum por aí. O segundo Antonio Adolfo & A Brazuca saiu em 1971 e marcou várias mudanças na banda. Pelo astral hippie da capa, já dá para perceber que o mergulho no soul e no rock foi total. Julie deixou a banda e foi substituída por um vocalista, Luiz Keller. E uma história curiosa: Vitor Manga deixara o grupo para excursionar com Wilson Simonal no México, um ano antes. Seus problemas com drogas acabaram fazendo com que o cantor de "Sá Marina" o despedisse - e ele, desgostoso, acabou morrendo de overdose. A tristeza com a partida de Vitor acabou gerando a carregadíssima balada "Tributo a Vitor Manga", literalmente chorada e berrada por Keller. Uma curiosidade: Vitor era sobrinho do homem-de-televisão Carlos Manga, que após a morte do músico, decidiu se vingar procurando Wilson Simonal durante meses, munido de um revólver - fato que foi revelado pelo próprio Carlos Manga, numa entrevista à Playboy, já nos anos 90. Vários amigos em comum acabaram impedindo que o encontro entre os dois acontecesse. Mais surpresas podem ser encontradas em músicas como "Panorama" (inspiradíssima em Marcos Valle), "Pela cidade", no clima samba-jazzy "Cláudia", na psicodelia de "Atenção! Atenção!", no progressivismo de "Transamazônica" e no soul pesado e hippie de "Que se dane". A primazia da parceria Antonio & Tibério é substituída por várias composições da dupla Luiz Cláudio Ramos/Mariozinho Rocha e por músicas creditadas à Brazuca. Após os dois discos gravados ao lado do grupo, Antonio lançaria mais um pela Philips, em 1972, e depois passaria a se dedicar à produção independente, gravando e distribuindo seus discos por conta própria, a partir do pioneiro selo Artezanal. Tibério iniciaria uma parceria com o cantor e compositor Guilherme Lamounier - que geraria um disco solo de Guilherme pela Continental em 1973 e o sucesso "Cabeça feita", gravado pela banda cearence O Peso - e recentemente lançou um CD solo. E mesmo não aparecendo tanto na mídia, a usina de criações da dupla já chamou a atenção até de pessoas improváveis - pode perguntar ao punk Jello Biafra, que já andou citando Antonio Adolfo em entrevistas. 3- ANTÔNIO ADOLFO & A BRAZUCA - 1971 Faixas: 01. Panorama 02. Cláudia 03. Tributo a Victor Manga 04. Pela cidade 05. Grilopus nº 1 (1ª parte) 06. Que se dane 07. Atenção, Atenção! 08. Cotidiano 09. Transamazônica 10. Cortando caminho 11. Grilopus nº 1 (2ª parte) 12. Caminhada 4- Rita Lee - BUILD UP - 1970 Faixas: 01. Sucesso, Aqui Vou Eu (Build Up) 02. Calma 03. Viagem ao Fundo de Mim 04. Precisamos de Irmãos 05. Macarrão com Linguiça e Pimentão 06. José ( Joseph ) 07. Hulla-Hulla 08. And I Love Her 09. Tempo Nublado 10. Prisioneira do Amor 11. Eu Vou Me Salvar No início de 1970, 0s Mutantes já traziam em sua bagagem três albuns e diversos sucessos. 0 stress já batera à porta e o grupo liderado por Rita Lee e pelos irmãos Arnaldo e Sérgio Dias Baptista estava em férias. Quinteto desde o último disco, A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado (1970), com a oficialização dos membros Liminha (baixo) e Dinho (bateria), os Mutantes aguardariam o vôo solo de Rita Lee. Estimulada pela diretoria da gravadora, notadamente pelo então presidente André Midani, Rita - que vinha fazendo diversos shows de moda, desfiles e happenings - acabou entrando em estúdio em São Paulo com seu marido e parceiro de banda, Arnaldo Baptista, que assumiria a direção musical, enquanto que Manoel Barenbein produziria o disco e Rogerio Duprat faria os arranjos. Os Mutantes so não estiveram inteiramente presentes neste primeiro álbum solo de Rita Lee porque o guitarrista Sérgio Dias não entendeu como bom para a banda que seus membros tivessem projetos paralelos. O lendário Lanny Gordin acabou fazendo os belos solos. O repertório procurou afastar Rita dos Mutantes, trazendo diversas parcerias dela com Élcio Decário. Mas, casualmente, foi com a versão José, do original francês Joseph (de Georges Moustaki), curiosamente assinada por Nara Leão (que na época morava em Paris e também versionou outras musicas), que este "Build Up" entrou para a história. Podendo ser considerado o disco #0 na carreira de Rita Lee, este trabalho foi logo seguido pelo projeto Tecnicolor dos Mutantes no final de 1970, arquivado em prol de Jardim Elétrico (71) - até ser enfim lançado pela Universal Music no ano 2000, exatos 30 anos após sua realização em Paris. Quando os Mutantes desejaram gravar um segundo LP em 1972, após País dos Baurets, a notícia de que não poderiam (ou deveriam) fazer dois trabalhos num mesmo ano acabou levando a um "jeitinho brasileiro": Hoje é o Primeiro Dia do Resto da sua Vida acabou sendo creditado a Rita Lee, como se fosse seu segundo álbum solo. A cantora eventualmente saiu da banda no início de 1973, montando a dupla Cilibrinas do Éden com a amiga Lucia Turnbull por alguns meses e finalmente criando o grupo Tutti Frutti - que sobreviveu acompanhando Rita por cinco anos. Tutti Frutti seria o terceiro (ou primeiro?) album solo de Rita Lee em 1973, mas o trabalho da banda não agradou a diretoria da gravadora que determinou seu arquivamento em função da idéia de que Rita gravasse um disco verdadeiramente solo para a Philips. Atrás do Porto Tem Uma Cidade acabou saindo em 1974, com o sucessoMamãe Natureza final mente solidifiicando Rita Lee como artista solo alguns anos depois de seu primeiro trabalho individual. Tutti Frutti, o disco arquivado, chegou a ser resgatado e remasterizado para lançamento no ano 2000, para cair novamente no limbo. 5- Rita Lee - HOJE É O PRIMEIRO DIA DO RESTO DA SUA VIDA - 1972 Faixas: 01. Vamos Tratar da Saúde 02. Beija-me Amor 03. Hoje é o Primeiro Dia do Resto da sua Vida 04. Teimosia 05. Frique Comigo 06. Amor Branco e Preto 07. Tiroleite 08. Tapupukitipa 09. De Novo Aqui Meu Bom José 10. Superfície do Planeta Cada vez mais dedicados a sua musica, ensaiando e viajando direto, Os Mutantes vibraram com a inauguração em São Paulo de um então moderno estúdio de 16 canais. Em meados de 1972, ano em que já haviam gravado e lançado um disco (Mutantes e seus cometas no país do baurets), eles resolveram experimentar a novidade. Entraram no recém-inaugurado Estúdio Eldorado e gravaram Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida, que sairia em outubro como se fosse um lançamento solo de Rita Lee. De fato, Rita brilha no disco. Participa da composição de sete das dez faixas, canta quase todas e ainda por cima desenhou a capa. Mais um trabalho produzido por Arnaldo Baptista, que também toca teclados e canta, e que tem como músicos Sérgio Dias Baptista (guitarra e voz), Arnolpho Lima Filho, o Liminha (baixo e vocal), e Ronaldo Paes Leme, o Dinho (bateria), é um disco dos Mutantes. Se alguém ainda tiver duvidas, basta colocar o CD no aparelho e aumentar o som. Canto de cisne de um dos mais criativos grupos de rock deste país, Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida é tambem o mais experimental dos discos do grupo. Da primeira faixa, Vamos tratar da saúde, a última, a clímática Superficie do planeta, espirram ousadias sonoras, competência instrumental e apuro técnico. Hoje é o primeiro dia... tem um tango (Beija-me a boca) cantado por Rita e pela guitarra de Serginho. Não é um exagero. Usando a boca para fazer ressonância, Sérgio Dias faz sua guitarra cantar. Em outra faixa, o delicioso samba-homenagem ao Corinthians, Meu amor branco e preto, Sérgio volta a usar o truque e faz a guitarra soar como um pato de desenho animado. Na gravação, os Mutantes usaram outro truque, muito repetido anos depois. Como fundo, puseram a narração de um jogo de futebol. O disco está repleto dessas ousadias, que culminam com um papo de estúdio sobre como gravar determinada música. Rita sugere o uso de quatro vozes em cada um dos 16 canais. Dito e feito. A sobreposição forma o gigantesco coral de 64 vozes que enfeita De novo aqui meu bom José. Foi uma despedida e tanto. No ano seguinte, Os Mutantes estreariam um show no Rio já sem Rita Lee. O que era doce, acabou. Ou melhor, espalhou-se. Texto de Fábio Rodrigues, encartado na reedição em CD 6- Rita Lee - ATRÁS DO PORTO TEM UMA CIDADE - 1974 Faixas: 01. De Pés no Chão 02. Yo No Creo Pero... 03. Tratos à Bola 04. Menino Bonito S 05. Pé de Meia 06. Mamãe Natureza 07. Ando Jururu 08. Eclipse do Cometa 09. Círculo Vicioso 10. ...Tem uma Cidade QUANDO Rita Lee deixou os Mutantes, já havia deixado uma incipiente e até hoje desvalorizada carreira solo (composta pelos discos Build Up, feito para um projeto da Rhodia, e por Hoje é o primeiro dia do resto da sua vida, um álbum dos Mutantes lançado em seu nome para não concorrer com o disco do grupo que havia sido lançado pouco antes). Sem saber o que fazer da vida, havia cogitado várias hipóteses, até a de desistir da música. E até a de suicídio. Praticamente seguindo, mesmo sem querer, os passos de seu ídolo David Bowie, Rita tentara começar no folk: juntou-se com a amiga e afilhada musical Lucia Turnbull e montou as Cilibrinas do Éden, que tocavam rock acústico fantasiadas de fadas voadoras. A dupla durou o suficiente para realizar um show flopado no festival Phono 73 (breve neste blog), em 1973, e desistir. A época era para rock progressivo, hard rock, coisas impávidas e colossais. Quem fizesse rock teria que soar alto. Lá fora, o glitter rock já dominava a cena, os precursores do punk eram o que havia de mais moderno, o progressivo ainda reinava, David Bowie era o fodão e a guitarra espacial de Marc Bolan era o que havia de bom. No Brasil havia MPB politizada e censurada, torturas, um cenário rockeiro incipiente e relegado ao underground, além da indefectível dupla samba e futebol. Foi nesse pé que Atrás do porto... chegou nas lojas. ANTES: A maneira como Rita Lee deixou os Mutantes é algo obscuro até hoje: se foi expulsa, se saiu porque quis... Conta-se que, ao tentar utilizar instrumentos como moog e mellotron (privados de bandas de rock progressivo, estilo que os Mutantes estavam fazendo por volta de 72/73) nos ensaios da banda, Rita ouviu piadinhas - chegou a tentar inserir seu sintetizador no arranjo do jazz-rock enfezado "Mande um abraço pra velha" (irônico canto do cisne da banda) e foi vetada de cara. Segundo o biógrafo Carlos Calado, a coisa foi num crescendo até que Arnaldo disse que não havia mais lugar para Rita na banda (e não havia mesmo - com músicas de dez minutos, vôos instrumentais e o guitarrista Serginho cantando cada vez mais, Rita parecia relegada a um papel decorativo, injusto para com quem havia bolado boa parte das loucuras dos Mutantes). Separada dos Mutantes, Rita casou-se de novo (com Mick Killingbeck, um misto de produtor, empresário, agitador cultural e guru do LSD) e começou a compor um novo repertório, diferente do que vinha fazendo com os Mutantes e totalmente livre das amarras progressivas de então. "Mamãe Natureza", a primeira música que saiu dessas sessões de composição, trazia na letra um relato ora conformado, ora esperançoso de Rita em relação às suas expectativas de carreira solo, no qual Rita se lançava e entregava tudo pra Deus ("Estou no colo da Mãe Natureza/Ela toma conta da minha cabeça/É que eu sei que não adianta mesmo a gente chorar/A mamãe não dá sobremesa"). Nem parecia que a mesma Rita dominaria as paradas de sucesso anos depois. Após uma experiência mal-sucedida de se apresentar abrindo para os Mutantes (com as Cilibrinas, que faziam um som folk e pífio para a época), Rita resolveu cair de boca no hard rock. Juntou-se a uma galera que, como ela, vinha da Pompéia (bairro-celeiro de músicos de São Paulo), e montou o Tutti-Frutti. O nome do grupo pode ser entendido tanto como uma referência ao famoso hit cantado por Little Richard, quanto à ascendência italiana dos músicos da banda (Luiz Sérgio Carlini na guitarra, Emilson Colantonio na bateria e Lee Marcucci no baixo, sem contar a amiga Lucia Turnbull). Seguindo a cartilha meio hard meio glitter da época e influenciadíssima por grupos e artistas como Slade, David Bowie e outros, Rita se lançava no mercado de forma definitiva, como se este fosse o seu primeiro disco. Vale lembrar que nos anos 70, mulheres rockeiras não eram algo que se achasse por aí em qualquer esquina - mulheres band-leaders, então, eram um verdadeiro absurdo. O SHOW: Com a banda formada, Rita começou a fazer suas primeiras apresentações em São Paulo. Os primeiros shows, que tiveram colaborações de gente como Zé Rodrix, Mônica Lisboa (ex-empresária de Rita) e Antonio Bivar na direção, tornaram-se clássicos. O show foi ganhando elogios da crítica e tornando Rita (já definitivamente em carreira solo) mais famosa. A única coisa bisonha que rolava era que, em quase todas as apresentações, Arnaldo costumava ir, sentar-se na primeira fila, e ficar fazendo caretas de desaprovação para Rita (!). Na época, os dois pouco se falavam, embora Arnaldo tenha chegado até mesmo a morar com Rita tempos depois, quando estava afundado nas drogas. O DISCO: O LP Atrás do porto tem uma cidade saiu em junho de 1974 e de cara enfrentou problemas com a gravadora. Como a Philips sempre desejou tirar Rita dos Mutantes (fato que foi revelado pelo próprio Liminha, ex-baixista do grupo, em uma entrevista nos anos 80), Rita começou a ser mais trabalhada pela gravadora que o normal. Enquanto Arnaldo Baptista gravou seu disco Lóki?, do mesmo ano (e que ficou às moscas) em São Paulo mesmo, Rita mudou-se para o Rio e ficou hospedada num apartamento em Santa Tereza, junto com o pessoal da banda. A intenção da gravadora era que Rita pudesse ser melhor orientada pelo "grupo de trabalho" da Philips - formado por pensadores, intelectuais e gente da gravadora, como Paulo Coelho, Roberto Menescal, Nelson Motta, André Midani e outros - de modo a poder gerir melhor sua carreira. As reuniões aconteciam geralmente em hotéis cariocas como o Copacabana Palace e o Meridién. A Philips queria que Rita fosse no mínimo uma superstar. Rita queria fazer roquenrol, "rock pauleira", como se dizia na época. Produzido por Mazola, o disco acabou não saindo lá muito ao gosto de Rita - que declarou que "a gravadora exigiu de mim uma star e o disco saiu malfeito". Problemas conceituais entre ela e a produção acabaram deixando o disco distante do que ela sonhava: a gravação foi feita no estúdio carioca da Philips - o melhor estúdio para se gravar rock na época era o Eldorado, em São Paulo - e a mixagem acabou saindo meio estranha. A banda Tutti-Frutti nem apareceu inteira - Emilson acabou sendo substituído por músicos de estúdio e as sessões tiveram participação de gente como a banda Azymuth. Isso, no entanto, não diminuiu o valor do disco: mesmo com tantos problemas, Atrás do porto... continua sendo até hoje um dos melhores discos de Rita. Nas letras, Rita mandava recados cifrados para amigos, para a gravadora, para os Mutantes e até para os homens do poder. FAIXA-A-FAIXA "DE PÉS NO CHÃO": A primeira faixa do disco era um fox-hard-rock bem T.Rex, cuja letra é cheia de mensagens irônicas e cifradas. Na época, até mesmo a sexualidade de Rita foi posta em dúvida, o que certamente gerou os versos da música. "YO NO CREO, PERO...": Meio mística, meio anti-ditatorial ("Segura a barra/A bruxa está solta...") a segunda música é um dos momentos mais progressivos do álbum, com direito a Rita tirando algumas notas do mellotron e fazendo solinhos de moog. "TRATOS À BOLA": Rock´n roll animadaço, acompanhado por palmas, com letra claramente dirigida a Arnaldo Baptista ("Eu ontem encontrei um amiguinho de infância/Aquele que vivia me chamando de bobinha"). Se um dia o pessoal do Stone Temple Pilots bota a mão nesse disco vai ficar doido. "MENINO BONITO": Diz a lenda que a gravadora pediu que o disco tivesse pelo menos uma música mais romântica e Rita fez essa, que tornou-se o maior sucesso do LP. O arranjo original era bem minimalista, só com piano, baixo e voz - e Rita nem chegou a ouvir o resultado final. Com o disco nas lojas, um dia Rita fazia compras no supermercado quando de repente toca "Menino bonito" no rádio: a gravadora tinha acrescentado um arranjo breguíssimo de cordas sem avisar à artista. "PÉ DE MEIA": Boogie rock com riffs quase stonianos (ou Sladianos, com um pouco de boa vontade), cantado em dueto por Rita e Lúcia. "MAMÃE NATUREZA": Rockarnaval visceral e explícito, mostrando a cara própria de Rita e do Tutti-Frutti. Foi o primeiro sucesso da cantora após deixar definitivamente os Mutantes. Luiz Carlini, um dos melhores guitarristas do Brasil, faz alguns dos solos mais legais já feitos em território pátrio. "ANDO JURURU": Resgatado nos anos 90 pelos Raimundos e por Kiko Zambianchi, o desabafo de Rita diante do esquemão do showbiz ainda soa atual. Milênios antes do Planet Hemp (que aliás tocou essa música em alguns shows) Rita já rimava "I know I have to do" com "cogumelo de zebu". "ECLIPSE DO COMETA": O momento paulocoelhal do disco - na verdade um bom recado para uma nação que, na época, vivia cabisbaixa. "E as pessoas precisavam dele/para levantar as cabeças/mas olhe bem, baby/Não é preciso cometas" "CIRCULO VICIOSO": Com trechos da letra surrupiados de "Neurastênico" (de Betinho, sucesso pré-Jovem Guardista), é outro momento prog do LP. Inclui um longo trecho instrumental no qual o Tutti-Frutti deita e rola. A frase "eu só quero brincar com a sua cabeça..." diz tudo a respeito da música. "...TEM UMA CIDADE": Estranha vinheta instrumental, de inspiração claramente blacksabbathiana, composta apenas por Rita. Dá a entender que havia alguma coisa a mais ali, que pode ter sido censurada. Texto de Ricardo Schott, publicado no site discotecabasica.com. | |||
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Atualizado em 20/04/2011
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